Gaza – Testemunho de Uma Agressão

  • 29
    Quarta-feira
    Março 2017
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    12
    Quarta-feira
    Abril 2017
9.00 h

Exposição fotográfica.

De 29 de março a 12 de abril
Horário

De segunda a sexta-feira, das 9 às 17 horas.

Textos e mapas
MPPM – Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente.

Fotografias
Missão Diplomática da Palestina em Portugal e Press House Palestine (BAS).


Entre 8 de julho e 26 de agosto de 2014, Israel bombardeou incessantemente a Faixa de Gaza e a sua população. Estas fotos transmitem-nos a bárbara realidade desse mês e meio de bombardeamentos.
A crueza dos números não relata os traumas psicológicos das crianças e adultos, as vidas destroçadas dos sobreviventes, as dificuldades de reconstrução num território onde tudo o que entra ou sai é sujeito ao férreo controlo de quem provocou a destruição.
Como é possível tolerar tudo isto?

O CERCO

A Faixa de Gaza tem 365 km² e quase um milhão e oitocentos mil habitantes. A sua densidade populacional é de cerca de 5 000 habitantes por km².
Juntamente com a Margem Ocidental, a Faixa de Gaza representa cerca de 22 % do território da Palestina histórica. É apenas nessa parte da Palestina que a Autoridade Palestina reivindica hoje a constituição de um Estado Palestino independente. Mas mesmo assim, esta reivindicação é negada por Israel e, na prática, pela chamada «comunidade internacional».
Gaza é hoje uma gigantesca prisão a céu aberto. Após décadas de ocupação israelita, vive sujeita a um férreo cerco desde 2007. Durante a agressão do verão de 2014 aos seus habitantes, era vedada qualquer possibilidade física de fugir aos bombardeamentos israelitas.
As águas costeiras são patrulhadas por Israel, que não apenas impede as entradas e saídas de pessoas e bens, como restringe fortemente as atividades piscatórias costeiras. O limite de 20 milhas náuticas constante dos Acordos de Oslo é uma ficção. Presentemente, o limite imposto por Israel é de 6 milhas náuticas – embora por vezes seja reduzido para 3 ou mesmo 0 milhas náuticas –, mas são frequentes as queixas de pescadores palestinos de serem atacados dentro destes limites.
As passagens terrestres estão reduzidas a três, uma para Israel – Erez / Beit Hanoun – e duas para o Egito – Rafah / Al ‘Awda e Kerem Shalom / Karm abu Salem, esta só para mercadorias –, mas a sua abertura é errática, sujeita à discricionariedade de autoridades israelitas e egípcias. Rafah esteve aberta menos de metade dos dias em 2014 e, em 2015, só esteve aberta 5 dias entre janeiro e abril.
Ao longo da fronteira com Israel, dentro do território de Gaza, o ocupante impõe uma «zona de exclusão» até aos 100 metros, uma «zona de acesso condicionado» até aos 300 metros e uma «zona de risco» até aos 1 000 metros. Na prática, qualquer atividade agrícola dentro da «zona de risco» pode custar a vida a quem a pratica.
Não há possibilidade de acesso por via aérea desde que o Aeroporto Internacional de Gaza foi destruído por Israel em 2002.
À quase total ausência de liberdade de movimentos imposta aos habitantes de Gaza, acrescenta-se o fortíssimo condicionamento ao trânsito de mercadorias que sufoca a já de si precária atividade económica da região.

A DOR

A agressão do verão de 2014 contra Gaza foi considerada a mais mortífera em Gaza desde que começou a ocupação israelita.
Ao fim dos 51 dias de agressão, foram registadas 2 131 vítimas mortais entre os palestinos, das quais 501 crianças e 257 mulheres. No mesmo período, houve 71 mortos israelitas, sendo 5 civis.
O número de feridos palestinos ascendeu a 11 000. Os grupos mais vulneráveis da população não foram poupados: 3 374 crianças, 2 088 mulheres e 410 idosos contam-se entre os feridos.
Devido à elevada densidade populacional e acentuada urbanização de Gaza, virtualmente toda a população ficou exposta à agressão. Nenhum local era seguro: habitações e hospitais, escolas e mesquitas usados como abrigo para os desalojados foram bombardeados sem contemplação.
Este trágico balanço não revela, todavia, as sequelas psicossociais do conflito. Crianças que viram os pais e familiares serem mortos, e ainda sofreram o trauma de serem desalojadas e separadas das suas famílias, vão necessitar de apoio continuado. Calcula-se que 373 000 crianças estejam nestas condições.
Estimativas preliminares apontavam para que cerca de 1 000 crianças ficassem com incapacidades permanentes. 1 500 crianças ficaram órfãs.
Durante a agressão, agravaram-se as insuficiências no sistema de saúde, tendo mais de 40 000 mulheres grávidas sido privadas do acesso a cuidados básicos. No Hospital Al Shifa a taxa de mortalidade neonatal duplicou, de 7 para 14 por cento.
Pessoas com deficiência, que são 2,4 % da população de Gaza, não puderam beneficiar de cuidados adequados à sua condição.
Os idosos sofreram da falta de medicamentos e de tratamento médico adequado. A sua exposição a continuadas agressões torna-os mais vulneráveis psicologicamente. A situação é particularmente difícil para idosas viúvas: 40 % das mulheres entre 60 e 70 anos são viúvas; a percentagem sobe para 90 % para mulheres acima dos 80 anos.

A DEVASTAÇÃO

A agressão israelita contra Gaza não só causou uma enorme perda de vidas, como provocou danos sem precedentes nas infraestruturas públicas, deixando centenas de milhares de pessoas sem acesso a eletricidade, água potável ou cuidados de saúde.
A maioria da população de Gaza perdeu os seus meios de subsistência. 419 fábricas e oficinas foram danificadas e 128 totalmente destruídas. O abandono forçado das terras e rebanhos levou à perda de 17 000 hectares de terras de cultivo e da maior parte das infraestruturas agrícolas como estufas, sistemas de rega, explorações pecuárias. Os pescadores estiveram proibidos de sair para o mar durante a agressão – ou faziam-no com risco de vida – e muitos perderam as suas embarcações.
A situação da água e do saneamento já era crítica antes da agressão, devido à sobre-exploração e contaminação do aquífero costeiro. A destruição de poços e condutas e a falta de eletricidade e combustível agravaram ainda mais a situação. Cerca de 30 % das infraestruturas da rede de água foram significativamente afetadas. 450 000 pessoas estiveram sem acesso a água.
Em consequência do bombardeamento aéreo da sua única central elétrica, em 29 de julho, a Faixa de Gaza ficou dependente, em exclusivo, da energia fornecida pelo Egito e por Israel, que não satisfazia as necessidades da região. A eletricidade teve que ser cortada durante 18 horas por dia.
18 000 habitações foram destruídas ou seriamente danificadas deixando 108 000 pessoas sem abrigo. Outras 37 650 foram danificadas mas continuaram a ser habitadas.
Há registo de danos causados em 277 escolas, 67 hospitais e centros de saúde, 260 mesquitas e 2 igrejas cristãs.
Toda esta devastação veio agravar ainda mais a já débil economia de Gaza onde, antes da agressão, já 57 % da população sofria de insegurança alimentar. A taxa de desemprego, no último trimestre de 2014, foi de 42,8 % (comparada com 18,7 % em 2000).
Antes da agressão já se registava um défice de 200 escolas e 71 000 habitações.

OS DESALOJADOS

No auge da agressão, 485 000 pessoas – 28 % por cento da população de Gaza – estiveram deslocadas internamente, incluindo em escolas da UNRWA (United Nations Relief and Works Agency), designadas como abrigos de emergência, em escolas oficiais, em abrigos improvisados, tais como edifícios devolutos, igrejas e mesquitas, e em famílias de acolhimento.
Mesmo depois de terminado o conflito, estima-se que cerca de 110 000 pessoas sejam desalojadas de longa duração, uma vez que as suas habitações ficaram destruídas.
Se bem que as organizações de auxílio humanitário tivessem preparado um plano de emergência para alojamento de pessoas deslocadas, com base em experiências anteriores, a brutal dimensão desta agressão frustrou todos os cálculos.
A necessidade de improvisar meios acrescentou mais sofrimento às pessoas que já tinham tido que abandonar os seus lares.
A falta de condições adequadas de higiene e sanidade; a sobrelotação e falta de privacidade, afetando em especial mulheres e jovens; a falta de água potável e eletricidade; a alimentação insuficiente e de qualidade questionável; o receio de contágio de doenças; a falta de assistência médica e medicamentosa; a carência de produtos não alimentares, como artigos de higiene pessoal ou cobertores, ou até material para improvisação ou reparação dos abrigos, tornaram mais dolorosa a situação dos desalojados.
A falta de habitação, sendo o principal, não era o único motivo que impedia o regresso de muitos habitantes de Gaza aos seus locais de residência. 
Uma preocupação grande é com os explosivos não detonados. Estima-se em cerca de 5 000 os engenhos explosivos que precisavam de ser inativados e que estavam em casas, jardins, ruas e estradas, campos, terras agrícolas, abrigos abandonados, escolas e outros serviços públicos, constituindo um risco, não só para os desalojados que quisessem regressar, como para crianças, agricultores e pessoal de auxílio humanitário. 
Outros fatores impeditivos do regresso foram a perda de fontes de subsistência e a falta de acesso aos serviços básicos.

A RESISTÊNCIA

O povo palestino sofre uma ocupação que dura há quase sete décadas e, no entanto, mantém tenazmente a sua luta pelo direito de viver num país que seja seu, na terra que sempre foi dos seus antepassados.
Não obstante a violência exercida pelo ocupante, de que a agressão militar é a expressão mais visível, mas que se faz sentir no quotidiano através das humilhações, das prisões administrativas, da destruição de casas, árvores e campos de cultivo, das medidas administrativas arbitrárias, a tudo isto o povo palestino resiste. Recorre à força quando não tem outra alternativa. Esgota todas as vias políticas até onde a honra o permite. Mas, sobretudo, dá um exemplo de tenacidade e dignidade na forma como está determinado a continuar a viver a sua vida, mesmo contra todas as adversidades.
A mulher que prepara a sua refeição no meio dos escombros, as crianças que fazem o sinal da vitória na sua casa em ruínas e os homens que fazem as suas orações na mesquita destruída são testemunhos de um povo que nunca se deixará subjugar. 
A poetisa palestina Fadwa Tuqan, no seu poema «O Dilúvio e a Árvore», escrito após a guerra de junho de 1967, ilustra bem a determinação do povo palestino em lutar pelos seus direitos: 

Quando a tempestade satânica chegou e se espalhou
No dia do dilúvio negro lançado
Sobre a boa terra verdejante
«Eles» contemplaram. 
Os céus ocidentais ressoaram com explicações de regozijo:
«A Árvore caiu!
O grande tronco está esmagado! O dilúvio deixou a Árvore sem vida!»
Caiu realmente a Árvore?
Nunca! Nem com os nossos rios vermelhos correndo para sempre,
Nem enquanto o vinho dos nossos membros despedaçados
Saciar nossas raízes sequiosas
Raízes árabes vivas
Penetrando profundamente na terra.
Quando a Árvore se erguer, os ramos
Vão florir verdes e viçosos ao sol
O riso da Árvore desfolhará
Debaixo do sol
E os pássaros voltarão
Sim, os pássaros voltarão com certeza
Voltarão.

A ESPERANÇA

Nós, palestinos, sofremos de uma doença incurável chamada «esperança».
Esperança na libertação e independência.
Esperança numa vida normal onde não sejamos nem heróis, nem vítimas.
Esperança de ver as nossas crianças ir para a escola sem perigo.
Esperança em que uma mulher grávida dê à luz um bebé vivo, num hospital, e não uma criança morta, diante de um posto de controlo militar.
Esperança em que os poetas vejam a beleza da cor vermelha nas rosas, e não no sangue.
Esperança em que esta terra recupere o seu nome original: «terra da esperança e da paz».
Obrigado por carregar connosco esta bandeira da esperança.

Mahmoud Darwish

Público-alvo
Geral
Local
Átrio dos Serviços Centrais da Câmara Municipal do Seixal

Telefone 212 276 700

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